terça-feira, 22 de julho de 2014

A Bela Dama Sem Piedade

Oh! O que pode estar perturbando você, Cavaleiro em armas,
Sozinho, pálido e vagarosamente passando?
As sebes tem secado às margens do lago,
E nenhum pássaro canta.

Oh! O que pode estar perturbando você, Cavaleiro em armas?
Sua face mostra sofrimento e dor.
A toca do esquilo está farta,
E a colheita está feita.

Eu vejo uma flor em sua fronte,
Úmida de angústia e de febril orvalho,
E em sua face uma rosa sem brilho e frescor
Rapidamente desvanescendo também.


Eu encontrei uma dama nos campos,
Tão linda... uma jovem fada,
Seu cabelo era longo e seus passos tão leves,
E selvagens eram seus olhos.

Eu fiz uma guirlanda para sua cabeça,
E braceletes também, e perfumes em volta;
Ela olhou para mim como se amasse,
E suspirou docemente.

Eu a coloquei sobre meu cavalo e segui,
E nada mais vi durante todo o dia,
Pelos caminhos ela me abraçou, e cantava
Uma canção de fadas.

Ela encontrou para mim raízes de doce alívio,
mel selvagem e orvalho da manhã,
E em uma estranha linguagem ela disse...
"Verdadeiramente eu te amo."

Ela me levou para sua caverna de fada,
E lá ela chorou e soluçou dolorosamente,
E lá eu fechei seus selvagens olhos
Com quatro beijos.

Ela ela cantou docemente para que eu dormisse
E lá eu sonhei...Ah! tão sofridamente!
O último dos sonhos que eu sempre sonhei
Nesta fria borda da colina.

Eu vi pálidos reis e também príncipes,
Pálidos guerreiros, de uma mortal palidez todos eles eram;
Eles gritaram..."A Bela Dama sem Piedade
Tem você escravizado!"

Eu vi seus lábios famintos e sombrios,
Abertos em horríveis avisos,
E eu acordei e me encontrei aqui,
Nesta fria borda da colina.

E este é o motivo pelo qual permaneço aqui
Sozinho e vagarosamente passando,
Descuidadamente através das sebes às margens do lago,
E nenhum pássaro canta.

(John Keats)

terça-feira, 8 de julho de 2014

Mortua Est

Como lírios velando sôbre os túmulos úmidos,
Ou badalar solene de um sino às horas graves,
Ou sonho que mergulha suas asas na amargura,
Assim atravessaste os penetrais do mundo.

Passasste, quando o céu lembra um campo sereno
Com seus rios de leite e mil flôres luz,
Ou quando as nuvens erguem seus solares sombrios
Abertos para a lua-rainha os visitar.

Vejo-te como sombra de prata reluzindo
As asas rijas, sôltas em direção do céu,
Subindo por degraus de nuvens, com a alma pálida
Contra as chuvas e os raios e as nevascas, ao léu.

Um raio te arrebata, um canto te conduz,
E vais, os braços alvos sôbre o peito cruzados,
Ao som da roca andando seus fios encantados,
Enquanto águas de prata refletem de ouro o ar.

Vejo tua alma pura passar pelos espaços,
Depois, contemplo a argila que alva e fria ficou...
Sôbre as vestes compridas, teu sorriso perene,
Que insiste ainda, vivo apesar do caixão.

E atingido na dúvida, pergunto ao meu espírito
Porque a tua morte, ó anjo de rosto vegetal?
Ainda há pouco jovem e linda, linda e jovem,
Quem sabe te escolheram para o frescor do sol!

É possível que encontres, aonde fôste, castelos
Com arcos de ouro armados em bases siderais,
Rios de fogo fluindo sob pontes de prata,
Junto às orlas de mirra e flôres que ressoem.

É possível que passes por ela, ó rainha,
Santa de cabeleira longa, olhar de luz,
Com tua fronte castanha num diadema de louros,
Com bordados de ouro na tua roupa de azul.

Ai, mas a morte é um caos, a morte é um mar de estrelas,
Se a vida é um pantanal de sonhos rebelados.
Ai, mas a morte é um século, de mil sóis enfeitado,
Quando a vida é uma lenda vazia e sem sentido.

Mas pode acontecer... ai! minha mente está cheia
Da divisão que ao mal o que é bom submete...
Quando o sol cai no poente e as estrêlas despontam,
Inclino-me também a crer que tudo é nada...

Bem pode acontecer que o céu parta em seus arcos,
E caia o nada, envolto na sua noite comprida,
E eu veja o céu de luto com as estrêlas errantes
Prisioneiras fugazes da morte sem retôrno...

Então, se isto ocorresse... então eternamente
Teu cálido suspiro jamais reviveria,
E a tua voz para sempre muda se tornaria...
Então, êsse anjo doce não passava de argila!