sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

TAG - One Lovely Blog Award

Antes de começar gostaria de agradecer muitíssimo a Vane, do blog In My Darkest Dreams por ter me indicado. Foi uma surpresa e honra ter recebido esta tag. Espero que gostem! <3

1. Por que resolveu criar um blog?
A ideia de criar um blog começou como um motivo um tanto quanto terapêutico para mim. Pessoalmente sou muito tímida e introvertida, o blog surgiu como uma maneira de me expressar à outra pessoas, conhecidas ou não, além de uma forma de fazer amizade.

2. Quais os benefícios que o blog te traz?
Descobri pessoas maravilhosas que compartilham comigo o gosto por literatura, poemas, músicas, pinturas e pensamentos.

3. Qual o post mais acessado?
Para o meu espanto foi o conto "A Pequena Vendedora de Fósforos" de Hans Christian Andersen com 564 visualizações. 

4. Você usa redes sociais?
Tenho contas em algumas redes, mas não as acesso com muita frequência... Acho que a que mais acesso é o Twitter uma vez ou outra depois do blog é claro.

5. Como o blog tem evoluído?
Penso que de 2012 para cá o blog evoluiu visualmente, mas em relação ao conteúdo penso que continuará exibindo os mais ou menos mesmos gêneros que vem sendo atualizados. Penso que algum dia desses juntarei coragem para postar poemas e pequenas histórias de minha autoria.

6. Já viveu algum fato importante por causa do blog?
Acabei descobrindo que alguns colegas de faculdade chegaram a acessar meu blog sem saberem que era meu. E conheci pessoas interessantes através dele.

7. De onde nasce a inspiração para escrever e continuar com o blog?
Penso que além do meu eterno fascínio por literatura gótica, mistérios música, pinturas e filmes, etc...  Os comentários sempre gentis de pessoas que acessam com frequência meu blog, a minha vontade de compartilhar o pouco que conheço e gosto.

8. O que você tem aprendido a nível profissional e pessoal esse ano?
Além da faculdade onde concluí mais um ano penso que os cursos que realizei como "A Performance de William Shakespeare", "A Arte da Poesia", "A História de Alexandre o Grande" e "A Ilíada" tirando os livros que também li contribuíram muito para meu crescimento pessoal. 

9. Qual é a sua frase favorita?
Essa pergunta é muito mal. É muito difícil para eu encontrar uma frase favorita, várias citações de vários autores me passaram pela cabeça, mas tem uma que ultimamente virou minha favorita, do livro "A Fazenda Blackwood" da Anne Rice: 

"Livros oferecem esperança - 
de que o universo todo pode abrir-se de suas páginas, 
e adentrando este universo você está salvo."
(Lestat de Lioncourt)

10. Qual conselho você daria para quem está começando agora no mundo dos blogs?
Acho que não existe realmente conselhos, mas escrever de assuntos dos quais gosta, de coisas que te inspiram. Penso que é simplesmente isso.

11. O que os blogs que você vai indicar tem em comum?
Ambos amam escrever e espero que gostem 

Ophelia



I.
Na onda calma e negra, entre os astros e os céus,
A branca Ofélia, como um grande lírio, passa;
Flutua lentamente e dorme em longos véus...
- Longe, no bosque, o caçador chamando a caça...

Mais de mil anos faz que a triste Ofélia abraça,
Fantasma branco, o rio negro em que perdura.
Mais de mil anos: toda noite ela repassa
À brisa a romança que em delírio murmura.

Beija-lhe o seio o vento e liberta em corola
Os grandes véus nas águas acalentadoras;
Sobre os seus ombros o salgueiro se desola,
Reclina-se o caniço à fronte sonhadora.

Nenúfares feridos suspiram por perto;
Às vezes ela acorda, em vidoeiro ocioso
Um ninho de onde vem tremor de um vôo incerto...
- De astros dourados desce um canto misterioso...

II.
Morreste sim, menina que um rio carrega,
Ó pálida Ofélia, tão bela como a neve!
- É que algum vento montanhês da Noruega
Contou que a liberdade é rude, mas é leve;

- É que um sopro, liberta a cabeleira presa,
Em teu espírito estranhos sons fez nascer
E em teu coração logo ouviste a Natureza
No queixume da árvore e do anoitecer.

- É que a voz do mar furioso, tumulto impávido,
Rasgou teu seio de menina, humano e doce;
- E em manhã de abril, certo cavalheiro pálido,
Um belo e pobre louco, aos teus pés ajoelhou-se.

E aí o céu, o amor: - que sonho, pobre louca!
Ante ele eras a neve, desmaiando à luz;
Visões estrangulavam-te a fala na boca,
O Infinito aterrava os teus olhos azuis!

III.
- E o Poeta diz que sob os raios das estrelas
Procuras toda noite as flores em delírio
E diz que viu na água, entre véus, a colhê-las

Vogar a branca Ofélia como um grande lírio.

(Arthur Rimbaud)

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Estrelas

Ah! Por que o sol brilhante
Restaurou a alegria à nossa Terra,
Vocês partiram, todas,
E deixaram um céu deserto?

Durante toda a noite, seus gloriosos olhos
Estavam fixos em mim,
E, com suspiros agradecidos de todo o coração,
Eu abençoei aquela visão divina.

Eu estava em paz, e absorvi seus raios de luz
Como se eles fossem vida para mim;
E deleitei-me em meus sonhos inconstantes
Como ave sobre o mar.

Pensamento seguiu pensamento, estrela seguiu estrela
Através de regiões infinitas;
Enquanto uma doce influência, perto e longe,
Entusiasmou-nos e provou-se única para nós!

Por que a aurora da manhã rompe
Um encanto tão grande, tão puro;
E queima com fogo a face tranquila,
Onde seu brilho refrescante tocou?

Vermelho-sangue, ele se levantou, e, apontou para mim,
Seus raios ferozes atingiram minha fronte;
A alma da natureza surgiu, elevada,
Mas a minha afundou triste!

Minhas pálpebras fecharam-se, mas através de seu véu
Eu o vi, brilhante, ainda,
E mergulhava em ouro o escuro vale,
E brilhava em cima da colina.

Eu voltei-me para o travesseiro, então,
Para chamar de volta a noite, e ver
Seus mundos de solene luz, novamente,
Pulsarem em meu coração, e em mim!

Isso não aconteceria – o travesseiro brilhava,
E brilhavam o teto e o chão;
E pássaros cantavam alto na floresta,
E ventos frescos sacudiam a porta;
As cortinas balançavam, as moscas despertas
Estavam zumbindo em volta do meu quarto,
Aprisionadas lá, até que eu levantasse
E as deixasse partir à vaguear.

Oh, estrelas, e sonhos, e gentil noite;
Oh, noite e estrelas, voltem!
E escondam-me da luz hostil
Que não aquece, mas queima;
Que drena o sangue dos homens que sofrem;

Que bebe lágrimas, em vez de orvalho;
Deixe-me dormir durante seu ofuscante reinado,
E acordar somente com você!

(Emily Brönte)

domingo, 2 de novembro de 2014

Caelica: 83


"Você que procura o que a vida é na morte,
Agora descobre que era ar em um suspiro.
Novos nomes desconhecidos, velhos nomes esquecidos:
Tempo que finda corpos, mas almas de modo algum.
Leitor! Faça tempo, enquanto podes, 
                                         Mas passos para sua eternidade."                                             


(Baron Fulke Greville)

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

A Estampa da Casa Maldita - H.P.Lovecraft

Os amantes do horror freqüentam sítios estranhos e remotos. Nada desejam senão as catacumbas dos Ptolomeus e os mausoléus esculpidos dos países de pesadelo. Sobem às torres enluaradas das ruínas de castelos dos Reno, descem negras escadarias, cobertas de teias de aranha, sob as pedras dispersas de esquecidas cidades da Ásia. A floresta encantada e a montanha inóspita são os seus santuários e eles se detêm longamente em torno dos sinistros monólitos de ilhas desabitadas. No entanto, o verdadeiro epicurista do horror, para quem uma desconhecida palpitação de inenarrável pavor constitui a finalidade maior e justificativa da existência, estima antes de tudo as fazendas antigas e solitárias do interior da Nova Inglaterra. Pois é ali que os soturnos elementos de força, solitude, grotesco e ignorância se combinam para moldar a quintessência do tétrico.


domingo, 19 de outubro de 2014

Desespero

Sobre os charcos noturnos ululando,
entre os negros ciprestes suspirando,
nos vendavais da noite remoinhando,
demoníacas formas noturnais;
contra os galhos desnudos se ferindo,
junto aos poços estanques estrugindo,
nas penhas, sobre o mar, repercutindo,
do desespero as sombras infernais.

Certa vez (ainda o vejo em pensamento),
antes que se estendesse um céu cinzento
sobre o meu juvenil atrevimento,
houve tal coisa como ser feliz;
o céu que agora é negro refulgia,
límpido e safirino resplendia,
mas logo vi que em sonhos é que eu via
tudo isso – no fatal torpor de Dis*.

Mas o rio do tempo, a transcorrer,
traz o tormento do desconhecer,
sempre fugindo, em seu cego correr
em direção àquele prado arcano;
enquanto o viajante enxerga aflito
do fogo-fátuo o fulgor esquisito
e do petrel maligno escuta o grito,
a vogar impotente para o oceano.

Asas malignas pelo éter batendo,
abutres que o espírito vão roendo,
vultos negros que passam, percorrendo
eternamente um céu de escuridão;
contornos espectrais de ida ventura,
cruéis demônios da aflição futura
se mesclam numa nuvem de loucura
e fazem da alma a sua habitação.

Assim os vivos, sós e soluçantes,
nos amplexos da angústia palpitantes,
são vítimas das fúrias repugnantes,
que à noite e ao dia vêm a paz roubar;
mas para além da dor e do lamento,
de uma vida de tédio e de tormento,
há de coroar o doce Esquecimento
tantos anos de inútil procurar.

(H.P.Lovecraft)

*Cidade invisível, mencionada num livro de Clark Ashton Smith e presente na "Demonologia de Cthulhu". Tradução: Renato Suttana

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Bright Star

Estrela brilhante! Fosse eu permanente como sois --
não em sólito esplendor suspenso na noite ao longe,
mas observante, com eternos cílios entreabertos,
tal da Natura paciente, insone eremita,


Das águas moventes em seu sacerdotal empenho
de ablução pura ao redor dos litorais humanos,
ou de entrever o pouso da novel máscara
da neve sobre montanhas e charnecas--


Não: conquanto permanente, e pois imutável,
envolto no maduro peito do meu Amor
para sentir para sempre o seu macio arfar,
desperto para sempre em doce inquietude;


Ainda, ouvir ainda a sua terna respiração,
e assim viver sempre --ou decair à morte.

(John Keats)
Tradução de: Horácio Costa

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Não fui, na infância, como os outros
e nunca vi como outros viam.
Minhas paixões eu não podia
tirar de fonte igual à deles;
e era outra a origem da tristeza,
e era outro o canto, que acordava
o coração para a alegria.

Tudo o que amei, amei sozinho.
Assim, na minha infância, na alba
da tormentosa vida, ergueu-se,
no bem, no mal, de cada abismo,
a encadear-me, o meu mistério.

Veio dos rios, veio da fonte,
da rubra escarpa da montanha,
do sol, que todo me envolvia
em outonais clarões dourados;
e dos relâmpagos vermelhos
que o céu inteiro incendiavam;
e do trovão, da tempestade,
daquela nuvem que se alteava,
só, no amplo azul do céu puríssimo,
como um demônio, ante meus olhos.

(Edgar Allan Poe)

Para relembrar o mestre que nesta mesma data partiu há 165 anos o autor, poeta, crítico literário e editor que fez parte do Movimento Romântico Americano, imortalizado por suas histórias de mistério, terror, do gótico e macabro: Edgar Allan Poe. "And my soul from out that shadow that lies floating on the floor... Shall be lifted - Nevermore!

sábado, 20 de setembro de 2014

Notas

" A alegria é uma borboleta
Voando sobre a face da terra, 
Mas a tristeza é um pássaro
de grandes asas negras
Que nos erguem muito acima da vida, 
Lá embaixo, à luz do sol, a vida flui, tudo cresce. 
O pássaro da tristeza, porém, voa bem alto, 
Lá onde velam os anjos da dor
Sobre o covil da morte".

(Edith Södergran)

terça-feira, 22 de julho de 2014

A Bela Dama Sem Piedade

Oh! O que pode estar perturbando você, Cavaleiro em armas,
Sozinho, pálido e vagarosamente passando?
As sebes tem secado às margens do lago,
E nenhum pássaro canta.

Oh! O que pode estar perturbando você, Cavaleiro em armas?
Sua face mostra sofrimento e dor.
A toca do esquilo está farta,
E a colheita está feita.

Eu vejo uma flor em sua fronte,
Úmida de angústia e de febril orvalho,
E em sua face uma rosa sem brilho e frescor
Rapidamente desvanescendo também.


Eu encontrei uma dama nos campos,
Tão linda... uma jovem fada,
Seu cabelo era longo e seus passos tão leves,
E selvagens eram seus olhos.

Eu fiz uma guirlanda para sua cabeça,
E braceletes também, e perfumes em volta;
Ela olhou para mim como se amasse,
E suspirou docemente.

Eu a coloquei sobre meu cavalo e segui,
E nada mais vi durante todo o dia,
Pelos caminhos ela me abraçou, e cantava
Uma canção de fadas.

Ela encontrou para mim raízes de doce alívio,
mel selvagem e orvalho da manhã,
E em uma estranha linguagem ela disse...
"Verdadeiramente eu te amo."

Ela me levou para sua caverna de fada,
E lá ela chorou e soluçou dolorosamente,
E lá eu fechei seus selvagens olhos
Com quatro beijos.

Ela ela cantou docemente para que eu dormisse
E lá eu sonhei...Ah! tão sofridamente!
O último dos sonhos que eu sempre sonhei
Nesta fria borda da colina.

Eu vi pálidos reis e também príncipes,
Pálidos guerreiros, de uma mortal palidez todos eles eram;
Eles gritaram..."A Bela Dama sem Piedade
Tem você escravizado!"

Eu vi seus lábios famintos e sombrios,
Abertos em horríveis avisos,
E eu acordei e me encontrei aqui,
Nesta fria borda da colina.

E este é o motivo pelo qual permaneço aqui
Sozinho e vagarosamente passando,
Descuidadamente através das sebes às margens do lago,
E nenhum pássaro canta.

(John Keats)

terça-feira, 8 de julho de 2014

Mortua Est

Como lírios velando sôbre os túmulos úmidos,
Ou badalar solene de um sino às horas graves,
Ou sonho que mergulha suas asas na amargura,
Assim atravessaste os penetrais do mundo.

Passasste, quando o céu lembra um campo sereno
Com seus rios de leite e mil flôres luz,
Ou quando as nuvens erguem seus solares sombrios
Abertos para a lua-rainha os visitar.

Vejo-te como sombra de prata reluzindo
As asas rijas, sôltas em direção do céu,
Subindo por degraus de nuvens, com a alma pálida
Contra as chuvas e os raios e as nevascas, ao léu.

Um raio te arrebata, um canto te conduz,
E vais, os braços alvos sôbre o peito cruzados,
Ao som da roca andando seus fios encantados,
Enquanto águas de prata refletem de ouro o ar.

Vejo tua alma pura passar pelos espaços,
Depois, contemplo a argila que alva e fria ficou...
Sôbre as vestes compridas, teu sorriso perene,
Que insiste ainda, vivo apesar do caixão.

E atingido na dúvida, pergunto ao meu espírito
Porque a tua morte, ó anjo de rosto vegetal?
Ainda há pouco jovem e linda, linda e jovem,
Quem sabe te escolheram para o frescor do sol!

É possível que encontres, aonde fôste, castelos
Com arcos de ouro armados em bases siderais,
Rios de fogo fluindo sob pontes de prata,
Junto às orlas de mirra e flôres que ressoem.

É possível que passes por ela, ó rainha,
Santa de cabeleira longa, olhar de luz,
Com tua fronte castanha num diadema de louros,
Com bordados de ouro na tua roupa de azul.

Ai, mas a morte é um caos, a morte é um mar de estrelas,
Se a vida é um pantanal de sonhos rebelados.
Ai, mas a morte é um século, de mil sóis enfeitado,
Quando a vida é uma lenda vazia e sem sentido.

Mas pode acontecer... ai! minha mente está cheia
Da divisão que ao mal o que é bom submete...
Quando o sol cai no poente e as estrêlas despontam,
Inclino-me também a crer que tudo é nada...

Bem pode acontecer que o céu parta em seus arcos,
E caia o nada, envolto na sua noite comprida,
E eu veja o céu de luto com as estrêlas errantes
Prisioneiras fugazes da morte sem retôrno...

Então, se isto ocorresse... então eternamente
Teu cálido suspiro jamais reviveria,
E a tua voz para sempre muda se tornaria...
Então, êsse anjo doce não passava de argila!


sexta-feira, 20 de junho de 2014

Lenore

Ah! Foi quebrada a taça de ouro!… seu sopro ao céu se dirige!
Dobrem os sinos!… A alma santa já flutua no rio Estige;
E tu, Guy De Vere, não choras?… teu pranto se verta agora
Ou nunca mais! Vê! No esquife jaz hirta a tua Lenora!
Vá, cumpra‑se o rito fúnebre: que a elegia se ouça!
Louvando a rainha dos mortos que morreu louçã e moça...
Pois duas vezes morreu quem tão jovem pereceu.

«Pulhas! Cobiçando‑lhe a fortuna, seu orgulho desdenhastes;
E quando ela adoeceu—e morreu—a abençoastes!
Como podeis cumprir tais ritos, cantar‑lhe o funéreo hino?
Como, se vosso olho é maldito, vossa língua viperina?
Se a inocência roubastes a quem tão jovem matastes?»

Peccavimus... mas não te agastes! Que o Sabat por nós se 
     entoe,
E o réquiem apraza a Deus e da morte não destoe!
Partiu antes de ti, Lenora, enlevada pelas esperanças,
E deixou‑te tresloucado, chorando a noiva‑criança...
Chorando a amada etérea, que já na terra se deita,
E a vida lhe aflora os cabelos, mas por seus olhos não
     espreita...
Ainda há vida nos cabelos, mas morte nos olhos belos.

«Fora! de vós, biltres, se evola a santa alma ultrajada...
Do Inferno ao Paraíso, para celeste morada...
Do vosso rude abandono para o trono que Deus guarda!
Não dobrem os sinos, então, para que em júbilo celeste
Sua alma não capte o som que vem da náusea terrestre!
A noite cai leve em meu peito... Não quero réquiem! Só resta
Inspirar‑lhe o voo alado com um Péan do passado!»


(Edgar Allan Poe)

(Tradução: Margarida Vale de Gato. Lisboa. 2009)

domingo, 1 de junho de 2014

Tédio

Passo pálida e triste. Oiço dizer
"Que branca que ela é! Parece morta!"
E eu que vou sonhando, vaga, absorta,
Não tenho um gesto, ou um olhar sequer...

Que diga o mundo e a gente o que quiser!
-O que é que isso me faz?... o que me importa?...
O frio que trago dentro gela e corta
Tudo que é sonho e graça na mulher!

O que é que isso me importa?! Essa tristeza
É menos dor intensa que frieza,
É um tédio profundo de viver!

E é tudo sempre o mesmo,eternamente...
O mesmo lago plácido,dormente dias,
E os dias,sempre os mesmos,a correr...

(Florbela Espanca)

sábado, 29 de março de 2014

Ithaka

Quando partires de regresso a Ítaca,
deves orar por uma viagem longa,
plena de aventuras e de experiências.

Ciclopes, Lestrogónios, e mais monstros,
um Poseidon furioso - não os temas,
jamais encontrarás tais coisas no caminho,
se o teu pensar for puro, e se um sentir sublime
teu corpo toca e em teu espírito habita.
Ciclopes, Lestrogónios, e outros monstros,
Poseidon em fúria- nunca encontrarás,
se não é na tua alma que os transportes,
ou ela os não erguer perante ti.

Deves orar por uma viagem longa.
Que haja muitas manhãs de Verão
em que com prazer, com que deleite,
você entre em portos 
que estará vendo pela primeira vez;

Em colônias fenícias deverás deter-te
para comprar artigos finos: de madrepérola e coral,
âmbar e ébano, perfumes sensuais de todo o tipo -
todos os perfumes sensuais que puder comprar...

E vai ver as cidades do Egito, para aprenderes com os que sabem muito.
Terás sempre Ítaca no teu espírito, que lá chegar é o teu destino último.
Mas não te apresses nunca na viagem.
É melhor que ela dure muitos anos,
que sejas velho já ao ancorar na ilha, rico do que foi teu pelo caminho,
e sem esperar que Ítaca te dê riquezas.
 
Ítaca deu-te essa viagem esplêndida.
Sem Ítaca, não terias partido.
Mas Ítaca não tem mais nada para dar-te.
Por pobre que a descubras, Ítaca não te traiu.
Sábio como és agora, senhor de tanta experiência,
terás compreendido o sentido de Ítaca.

(C.P.Cavafy)

quinta-feira, 13 de março de 2014

Soneto 43

Quando eu mais pisco faço melhorar meu olhar,
para todos os dias, olhar coisa ignorada,
mas, quando durmo, meus sonhos, olham a ti,
e, brilhante breu, são dos brilhos negros guiados.
Cujas sombras das sombras tecem-se brilhantes,
como seria a sua sombra o feitio feliz vê-la,
com o dia claro com sua luz muito mais clara,
quando ocultos olhos sua sombra brilha assim?
Como seria (digo) meu olhar fosse bem dito,
ao admirar lhe de ti na existência do dia,
quando morte noturna faz viciosa sombra.
Por meio denso sono cego olhar fiquei?
Todos os dias são noites até que possa olhá-la,
e noites vivos dias quando não mostrar sonhos.

(William Shakespeare - Tradução. Éric Ponty)

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

A Musa Enferma

Que tens esta manha, Musa de olhar magoado?
Teus olhos ocos são todos visões noturnas,
Vejo que a tua tez ora tem alternado
Loucura com horror, as sombras taciturnas.

Sôbre ti, róseo duende e súcubo esverdeado
Derramaram o mêdo e o amor de suas urnas?
O pesadelo, o punho despótico e irado,
No fundo te afogou de mítico Minturnas?

Quisera que, exalando o aroma da saúde,
Teu seio fôsse só a fôrça e a juventude
Que o teu sangue cristão fôsse fluxos marítimos

Como o inúmero som dêstes antigos ritmos,
Em que alternam seu reino o inventor da cantiga
Febo e o divino Pã, o senhor da áurea espiga.

(Charles Baudelaire)

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

A Pequena Vendedora de Fósforos - Hans Christian Andersen

Fazia um frio terrível; caía a neve e estava quase escuro; a noite descia: a última noite do ano. Em meio ao frio e à escuridão uma pobre menininha, de pés no chão e cabeça descoberta, caminhava pelas ruas.Quando saiu de casa trazia chinelos; mas de nada adiantavam, eram chinelos tão grandes para seus pequenos pezinhos, eram os antigos chinelos de sua mãe. A menininha os perdera quando escorregara na estrada, onde duas carruagens passaram terrivelmente depressa, sacolejando. Um dos chinelos não mais foi encontrado, e um menino se apoderara do outro e fugira correndo. Depois disso a menininha caminhou de pés nus - já vermelhos e roxos de frio. Dentro de um velho avental carregava alguns fósforos, e um feixinho deles na mão. Ninguém lhe comprara nenhum naquele dia, e ela não ganhara sequer um níquel. Tremendo de frio e fome, lá ia quase de rastos a pobre menina, verdadeira imagem da miséria! Os flocos de neve lhe cobriam os longos cabelos, que lhe caíam sobre o pescoço em lindos cachos; mas agora ela não pensava nisso. Luzes brilhavam em todas as janelas, e enchia o ar um delicioso cheiro de ganso assado, pois era véspera de Ano-Novo. Sim: nisso ela pensava! Numa esquina formada por duas casas, uma das quais avançava mais que a outra, a menininha ficou sentada; levantara os pés, mas sentia um frio ainda maior. Não ousava voltar para casa sem vender sequer um fósforo e, portanto sem levar um único tostão. O pai naturalmente a espancaria e, além disso, em casa fazia frio, pois nada tinham como abrigo, exceto um telhado onde o vento assobiava através das frinchas maiores, tapadas com palha e trapos.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Mito: Damon & Pythias

"O que é um amigo? Uma alma habitando dois corpos". (Aristóteles)

Sempre que se fala de bons amigos, fidelidade e companheirismo, logo me vem à mente a história de Damon e Pítias, personagens da mitologia grega e símbolo do que lhes quero contar. Na mitologia grega, simbolizam a confiança e a lealdade de uma verdadeira amizade.