domingo, 25 de agosto de 2013

A Noiva do Mar

Altas, as negras falésias se elevam atrás de mim,
e a vasta areia em que piso é só um negror distendido:
mal se vislumbram as trilhas e as rochas que me recordam
dolorosamente os anos de um Nunca-Mais já perdido.

Batendo suavemente nas pedras, a onda produz
um som que ainda é para mim tão doce e familiar;
aqui – com sua cabeça pendida sobre meu ombro –
passeávamos, lado a lado, eu e Unda, a Noiva do Mar.

No amanhecer refulgente da juventude, encontrei-a,
doce qual vento a soprar sobre o mar frio e salgado.
Bem cedo o Amor enleou-nos com seus mais fortes grilhões:
ela feliz por ser minha, e eu por estar ao seu lado.

Pergunta jamais lhe fiz acerca de seu passado,
e ela jamais indagou de minha origem e andanças:
sem pensamentos e idéias, felizes só desses dons
do largo oceano e da terra, éramos como crianças.

Certa vez, quando brincava suave o luar sobre as ondas,
ficamos a olhar as águas lá do alto, sobre o rochedo,
seus cabelos adornados por uma trança de flores
colhidas junto a uma fonte do mavioso arvoredo.

Estranhamente ela olhava o mar inquieto a seus pés,
como dos sons absorvida ou da luz arrebatada;
então as ondas lhe deram o aspecto estranho, selvagem,
de um oceano bravio ou de uma noite encantada.

Friamente, ela afastou-se, muito atordoada, a chorar,
sozinha, em meio às legiões que ela porém bendizia,
e a descer, sempre a descer, a escorregar, quase caindo,
em direção ao oceano minha doce Unda fugia.

O mar então se acalmou e, de um raivar tumultuoso,
passou a um leve marulho, enquanto Unda, divinal,
caminhou sobre as areias com gestos de gratidão,
e, acenando-me em convite, sumiu sem deixar sinal.

Perscrutei por longo tempo o lugar onde sumira.
Subiu a lua no céu e após baixou. E o fulgor
da manhã cresceu, cinzento, banindo a noite tristonha,
mas minha alma ainda sofria a sua infinita dor.

Percorri o mundo inteiro em busca da que eu amei,
andei por vastos desertos e naveguei pelos mares.
Certa vez, por sobre as ondas, no tumulto da procela,
entrevi um belo rosto que acalmou os meus pesares.

Desde então tenho avançado, sem achar paz ou sossego,
às cegas, aos tropeções, de mim mesmo mal consciente.
Até que chego ao lugar onde reboam as águas,
de volta à cena daquele Ontem perdido e dolente.

Deus! a lua avermelhada sobe das névoas do mar,
crescendo ominosamente à vista; estranho é o seu rosto
ao meu olhar torturado que, através das vastidões
de rutilâncias e azuis, mira o longe com desgosto.

Da lua desce uma ponte feita de ondas e de raios
que toda brilhante chega à praia onde estou, tristonho.
Quão frágil parece, e entanto que tentação não me vem
de atravessá-la e subir ao orbe de um doce sonho!

Que face é aquela que vejo em meio aos raios do luar?
Enfim terei encontrado a donzela fugitiva?
Cruzando a ponte de raios, os meus passos se aproximam
daquela cujo convite tão meigo me apressa e aviva.

Envolvem-me correntezas, e num vogar indolente
por essa estrada de luar procuro o seu rosto amado.
Ansiosamente me apresso, entre preces, ofegante,
num esforço de alcançar aquele vulto abençoado.

As águas, murmurejando, se fecham ao meu redor;
suave, a doce visão para mim põe-se a avançar.
Findou a minha procura: meu coração finalmente,
a salvo, repousa ao lado de Unda, a Noiva do Mar.

(H.P.Lovecraft)

domingo, 11 de agosto de 2013

Ecos d'Alma

Oh! madrugada de ilusões, santíssima,
Sombra perdida lá do meu Passado,
Vinde entornar a clâmide puríssima
Da luz que fulge no ideal sagrado!

Longe das tristes noites tumulares
Quem me dera viver entre quimeras,
Por entre o resplendor das Primaveras
Oh! madrugada azul dos meus sonhares.

Mas quando vibrar a última balada
Da tarde e se calar a passarada
Na bruma sepulcral que o céu embaça

Quem me dera morrer então risonho
Fitando a nebulosa do meu sonho
E a Via-Látea da Ilusão que passa!

(Augusto dos Anjos)

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Remorso Póstumo

Quando fores dormir, ó bela tenebrosa
Em fundo de uma cripta em mármore lavrada
Quando tiveres só por alcova e morada
O vazio abismal de carneira chuvosa;

Quando a pedra, a oprimir tua fronte medrosa
E teus flancos a arfar de exaustão encantada,
Mudar teu coração numa furna calada
Amarrando-te os pés na rota aventurosa,

A tumba, confidente do sonho infinito
(Pois toda a vida a tumba há de entender o poeta),
Pela noite imortal de que o sono é prescrito,

Te dirá: "De que serve, hetaira incompleta,
Não teres conhecido o que choram os mortos?"
E os vermes te roerão assim como os remorsos.

(Charles Baudelaire)

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Larenopfer

"Ouçam, o passo da noite morre
no vasto silêncio;
a luz sobre a minha escrivaninha canta
baixo como um grilo.

Douradas sobre a estante
brilham as lombadas dos livros:
pilares para as pontes
da viagem ao país das fadas".

(Rainer Maria Rilke)

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Sweet Curse - ReVamp

É um fardo por nenhuma razão,
Mas continuo mantendo esta dor.
Sem lágrimas, apenas uma mútua tristeza,
No entanto ela persiste dia após dia.
Deixa-lá ir: nunca pude, mas preciso curar-me.
Doce maldição, meu inferno. 

Você suporta nossas memórias, como cicatrizes manchadas dentro de sua mente.
Perdeste tudo que sabia de mim, profundamente absorto
Amor perdido, meu inferno. 

Doce é a maldição dos corações entrelaçados mas perdidos, separados mas unidos.
Triste é o seu destino sem alívio. 
Cruel é a maldição do amor, tão voluptuoso e perigoso. 
Doce maldição, nosso inferno. 

Palavras não foram feitas para contar esta história,
Pois não consigo descrever a aflição
Sem remorso por sua traição,
No entanto difícil de aceitar...
Como pôde a beleza imperceptivelmente transformar-se em algo monstruoso, não sei.
Amor perdido é o meu inferno

Doce é a maldição dos corações entrelaçados mas perdidos, separados mas unidos.
Triste é o seu destino sem alívio. 
Cruel é a maldição do amor, tão voluptuoso e perigoso. 
Doce maldição, nosso inferno. 

Sem esperanças e sonhos perdidos
Matam-te lentamente
novas cicatrizes e novos anseios tomam controle
(Novos desejos, novo desespero)

Perder-te foi mais do que poderia suportar
Nos perder, foi um mergulho em águas profundas
Perder você... 

Doce é a maldição dos corações entrelaçados mas perdidos, separados mas unidos.
Triste é o seu destino sem alívio. 
Cruel é a maldição do amor, tão voluptuoso e perigoso. 
Doce maldição, nosso inferno.