sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

Poesia

"Da primeira vez em que me assassinaram
Perdi um jeito de sorrir que eu tinha...
Depois, de cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha...

E hoje, dos meus cadáveres, eu sou
O mais desnudo, o que não tem mais nada...
Arde um toco de vela, amarelada ...
Como o único bem que me ficou!

Vinde, corvos, chacais, ladrões da estrada!
Ah! Desta mão, avaramente adunca,
Ninguém há de arrancar a Luz Sagrada!

Aves da Noite! Asas do Horror! Voejai!
Que a luz, trêmula e triste como um ai,
A luz do morto não se apaga nunca!"

(Mário Quintana)

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

O Espírito do Tejo

"Tu, de quem o sol é sombra,
De quem cadáver o mundo,
Meus passos guia, aqui na sombra
O sentir-te, ermo e profundo

Presença anónima e ausente
De quem a alma é o véu
A meus passos de um consciente
Tão consciente que é teu

Para que, passadas eras
De tempo ou alma ou razão
Meus sonhos sejam esferas
Meu pensamento, visão

Bem sei que todas as mágoas
São como as mágoas que são
Parecidas com as águas
Que continuamente vão

Quero pois ter guardada
Uma tristeza de mim
Que não possa ser levada
Por essas águas sem fim

Quero uma tristeza minha
Uma mágoa que me seja
Uma espécie de rainha
Cujo trono se não veja

A madrugada irreal do quinto império doira as margens do Tejo…"

(Thragedium feat. Fernando Ribeiro)

domingo, 2 de outubro de 2016

O que Dorme

"O senhora esperta! Pode estar correta - 
Esta janela para a noite aberta? 
Os impudicos ares, nos arbóreos topos
Passam risinhos pela teia de tocos - 
Os incorpóreos ares, do mago a ruína, 
Fugazes por tua câmara, baixo e cima,
E no dossel sacode o arvoredo
Com parcimônia - com medo - 
Sobre a cerrada e franjada aba
Sob a qual se esconde e hiberna tu'alma,
Assim, ao pé da parede e ao rés chão,
Como visões as sombras vêm e vão!
Oh! Querido amor, não tens tu temor?"

- Edgar Allan Poe

domingo, 10 de julho de 2016

A Rosa do Mundo

"Quem sonhou que a beleza passa como um sonho?
Por estes lábios vermelhos, com todo o seu magoado orgulho,
Tão magoados que nem o prodígio os pode alcançar,
Tróia desvaneceu-se em alta chama fúnebre,
E morreram os filhos de Usna.

Nós passamos e passa o trabalho do mundo:
Entre humanas almas que se agitam e quebram
Como as pálidas águas e seu fluxo invernal,
Sob as estrelas que passam, sob a espuma do céu,
Vive este solitário rosto.

Inclinai-vos, arcanjos, em vossa incerta morada:
Antes de vós, ou de qualquer palpitante coração,
Fatigado e gentil alguém esperava junto ao seu trono;
Ele fez do mundo um caminho de erva
Para os seus errantes pés".

(William Butler Yeats)

segunda-feira, 4 de julho de 2016

Os Ossos da Dor

"Dourados são os ossos da dor.
Seu brilho não tem para onde ir.
Ele submerge,
Perfura a neve.

As lágrimas dos pais que bebemos
O leite materno e o corpo putrefato afinal
Podemos sonhar mas não pensar.
Dourados ossos enfeitam as bordas.

Prata cobre seda dourada.
A dor é água ferida por leite.
Ataque cardíaco, assassino, câncer.
Quem iria imaginar que esses ossos fossem tão bons dançarinos.

Dourados são os ossos da dor.
Esqueleto sustenta esqueleto.
Palavras de fantasmas não são para entender.
Ignorância é o que há para aprender".


(Stan Rice, Some Lamb, 1975
In: O Servo dos Ossos. Anne Rice)

domingo, 22 de maio de 2016

The Misty Moutain's Cold





Far over the misty mountains cold
To dungeons deep and caverns old 
We must away, ere break of day, 
To find our long-forgotten gold. 

The pines were roaring on the height,
The winds were moaning in the night. 
The fire was red, it flaming spread; 
The trees like torches blazed with light. 

Far over the misty mountains cold
To dungeons deep and caverns old 
We must away, ere break of day, 
To find our long-forgotten gold. 

The pines were roaring on the height,
The winds were moaning in the night. 
The fire was red, it flaming spread; 
The trees like torches blazed with light. 


P.S.: Uma das várias versões da música dos anões de Tolkein.



segunda-feira, 2 de maio de 2016

quinta-feira, 7 de abril de 2016

Os Cisnes

"A vida, manso lago azul algumas
Vezes, algumas vezes mar fremente,
Tem sido para nós constantemente
Um lago azul sem ondas, sem espumas,

Sobre ele, quando, desfazendo as brumas
Matinais, rompe um sol vermelho e quente,
Nós dois vagamos indolentemente,
Como dois cisnes de alvacentas plumas.

Um dia um cisne morrerá, por certo:
Quando chegar esse momento incerto,
No lago, onde talvez a água se tisne,

Que o cisne vivo, cheio de saudade,
Nunca mais cante, nem sozinho nade,
Nem nade nunca ao lado de outro cisne!"

(Júlio Salusse)